Propinópolis e sua moeda
Era uma vez um lindo país tropical, bonito por natureza que, é lógico, não existe. E nem poderia existir, com as características que possui. Mas mesmo não existindo, vocês saberão do que estou falando, por que está na imaginação de todo mundo. Chama-se Propinópolis.
Conta a lenda que o país foi descoberto por portugueses, lá pelo longínquo ano de 1500. Não posso garantir por que eu não estava lá e nem havia nascido ainda.
Já naquela época a América do Sul, onde fica Propinópolis, era considerada terceiro mundo e nem existia. Óbvio, para muitos só havia um mundo conhecido, o primeiro da época, chamado Europa. Tão logo a América sulista nasceu e já começou a ser explorada, coisa que acontece até hoje, talvez devido a alguma contaminação genética. Sua irmã do norte, descoberta quase na mesma época, desde o início foi considerada o segundo mundo, colonizada e educada para crescer, e nos séculos seguintes foi promovida a primeiro mundo, invejada por todos os infelizes moradores do hemisfério de baixo e até mesmo pelos antigos detentores do título, o lugar que passou a ser chamado de Velho Mundo.
Propinópolis não foi colonizado e muito menos educado para crescer, porque já era grande o suficiente para poder trabalhar. O fruto do trabalho seguia para o primeiro mundo, o anterior e o posterior, na forma de recursos minerais, vegetais e laborais, e em troca, era abastecido com ladrões, condenados e degredados, origem do DNA que todos os propinopolenses carregam até hoje. Passada a fase de trocas e parcialmente a de apropriações unilaterais, o país começou a se desenvolver, graças a moeda que havia adotado, embora no início não tivesse o nome atual: Propina Real. Manteve outras moedas ativas, apenas por motivos político-financeiros.
É a Propina que move a economia, a política e todos os negócios atualmente, coisa difícil de acreditar, até para os nativos conscientes, uma raça em extinção. A moeda ganhou força há coisa de vinte anos, desde que bandidos profissionais, com formação superior, começaram a invadir postos influentes nas empresas, nas mídias informativas, principalmente na TV, no mundo financeiro e é claro, na política. Estimularam tanto a valorização da Propina, com uma tal eficiência, que coisas inimagináveis começaram a existir. Por exemplo, enquanto no resto do mundo são criadas Leis como ferramentas para se promover a Justiça, em Propinópolis as Leis se sobrepõe à Justiça. É comum se ver assassinos confessos e ladrões pegos em flagrante sendo libertados graças a leis escritas por seus párias, devidamente custeadas por vultosas Propinas. Existe até mesmo igrejas vendendo lugares no Céu a troco de Propinas.
O governo estimula e se favorece com o crescimento da moeda. Os maiores detentores de Propinas vivem alardeando o crescimento do PIB, o decréscimo da classe paupérrima, o acumulo de Propinas nos cofres públicos, nacionais e estrangeiros, mas não falam que a maior circulação de Propinas achata a classe trabalhadora assalariada, que ainda recebe em outras moedas nunca valorizadas.
Os infiltrados no poder público para estimular a moeda que já usavam, logo que conquistaram o poder descobriram a palavra mágica para resolver todos os problemas: mudanças.
A primeira foi mudar o nome de um projeto do governo anterior, que passou a se chamar “Bolsa Propina Família”. Com este projeto o povo começou a receber umas poucas Propinas para manter o partido atual no poder, o PCF, Partido dos Companheiros Fiel (atenção revisores, se escreve assim mesmo: Companheiros no plural e Fiel no singular, não é erro de concordância). O Projeto fez tanto sucesso que atraiu todas as Grandes Nações vizinhas: Colômbia, Peru e Venezuela, interessadas mais na parte de perpetuar o poder do que em algum eventual benefício para o povo.
Tem muito mais coisa para contar. Por exemplo, a ultima visita do Papa, que deu origem a um incontável numero de mudanças. Foram mudadas milhares de nomes de avenidas, ruas, praças, becos e vielas.
Ou como o governo resolveu o problema das manifestações populares pedindo mudanças. Mudança é a especialidade do PCF. Aliado à sua experiência em infiltrações, foi fácil demais: bastou uma letra. Apenas infiltrou baderneiros nas manifestações e mudou “Movimento Legítimo” para “Movimento Ilegítimo”. Pronto, problema resolvido.
Mas isto é tema para outro texto, num outro dia.
Ainda bem que Propinópolis não existe. Eu não conseguiria viver num país assim.
Parece que restaram algumas coisas que fazem a gente ficar nesse país descrito aí.... minha varanda dá vista para um pequeno vale, e vejo algumas aves aproveitando o ar quente para planarem, e outros grupos de araras, grupos pequenos, voarem decididas para uma certa direção...
ResponderExcluirDessa minha varanda vejo o pôr do sol deslocando-se para a direita e depois para a esquerda conforme muda a estação do ano... vejo as nuvens geralmende de sudoeste apontando no horizonte e vindo rapidamente em nossa direção, às vezes mais escuras e aí consigo antever a força de uma chuva...
Enquanto eu me encantar com tudo isso e muitas outras coisas do pequeno vale, eu fico nesse país...
Como conversamos hoje, guardo comigo todos os artigos e crônicas de jornais que acho interessantes. Bem, guardar num sentido bem amplo... Guardo em papel na gaveta, na memória, numa lista em meu desktop de links/URLs...
ResponderExcluirE "Propinópolis e sua moeda" fará parte de minha coleção. É um texto adorável !